terça-feira, 29 de março de 2011

A foto e um fato



Bem, numa manhã qualquer …
Perguntei ao meu amor o que ele queria pro café
Com toda a sabedoria de um sentimento calejado, mas que não desiste e nem se abala
Ele me sugeriu uma companhia, e eu olhei a foto sobre a mesa desarrumada
Peguei o telefone
“Que bom, ainda lembro o número”
Disquei 22 vezes a mesma tecla
Numa dúvida cruel, e enigmática
Eu jogava, eu sorria, eu chorava, eu queria …
Talvez por tentar não sofrer, eu sorria falsamente
E já que não tinha ninguém olhando …
Dancei ao lado da cama, e foi vida ali, sabe?
Suei, me diverti como nos tempos de amigos
Mas me vi no espelho, estranho …
Só eu sei o que faço, pra não fazer-se perceber o que sinto
E agora sozinho, sei lá
O problema é que …
O meu sentir é impaciente
O meu sentir é inadequado
O meu sentir é muito novinho
E mais ainda, o meu sentir é tão antigo
Molde das buscas por felicidade
E não conquistas
Que ser feliz seja conquista de quem ama, de quem vive, de quem quer
Mas que não seja falso, malcriado, abatido
Ou solidário ao que não se quer, só por haver possessão envolvida
Triste é aquele que se diz possuir alguém
Ou possuir riqueza
Se em toda sua recompensa não tiver um pouquinho de calor humano que seja

Procurei as chaves do carro, que tal uma volta?
Melhor …
Vou caminhar
Assim esqueço as chaves, esqueço os lucros, esqueço as perdas
Esqueço que às vezes me matam
Sorrir é tão complicado
O rosto até faz o movimento, mas o pensamento está sempre atrasado
E nunca o acompanha
O rosto se retrai, e está aí …
Meu semblante guerreiro, meu semblante tão jovem
E já gasto, quantos contrassensos, meu Deus!
Mas estar vivo é isso
Viver é que talvez seja outra coisa
O fato é que só quem gosta muito de si …
Pode se deixar ser amado por alguém
E só quem é amado por alguém
Sabe que o amor vale a pena
E só quem vê o quanto vale a pena ter alguém
Se dispõe a gostar mais ainda de si
Só pra que o outro se sinta bem
É isso que é bonito
E vivo, daí a vivacidade das coisas
E é nessas horas que eu sempre choro

Então o amor acalma tudo ?
O segredo é sempre ter alguém ?
Toda e qualquer angústia e qualquer dor e qualquer caminho, por mais tortuoso e doloroso que tenha sido, é apaziguado porque aquela pessoa, e só aquela, te tratou tão bem, ao ponto disso tudo se tornar um passado remoto, e que hoje até causa risos do teu próprio desespero ?

Não sei, talvez sim
Eu só estava pensando .

“Fotos …
Eu tenho umas tão doces, guardadas no mais íntimo carinho pensado
Mas também tenho as velhas lembranças cristalizadas ou no papel
E é tão bom olhar pra elas
Quanto é ruim não estar lá
E vice-versa

Tudo bem, já parei de saudades.”

Daniel Sena Pires – A foto e um fato (30/03/2011)

terça-feira, 22 de março de 2011

Helena (As minhas estações)






A história que a vida me conta , dia após dia , consola ...
Mas às vezes incomoda e fere .
A criança nos braços da mãe ...
O choro , o soluço , o pedir sem querer .
O distanciamento de tudo na adolescência , as novidades que assustam .
Fases difíceis , transformações ...
O corpo que cresce ...
O homem que sorri , e constrói .
Num instante de estar são , feliz com qualquer brisa no rosto ...
Porém frágil o bastante para ser abalado por palavras , gestos e menções .
Faço do amor o fogo que aquece o coração ...
Já que , enquanto humano , necessito de atenção .
E buscando amor , me sinto renascendo a cada momento ...
Como se vivesse tudo de novo , aprendendo a gostar de cada dia , cada minuto , cada mera mudança de tempo .
E verão um dia que de mim restará a essência das estações ...
As várias primaveras de sorrisos , iluminadas por belezas tão mais raras ...
Que não há a necessidade de entendimento , só se sabe que foi real .
Invernos rigorosos , distante de gostar de qualquer coisa e até de mim ...
Mas no fim de tudo as folhas rolam no chão , e posso chutá-las alegremente .
Gritando ao tempo , ao vento e ao mundo :
"Vivi , nasci com esse dom ..."
"Amei , dom melhor não haveria de ter ..."
Cada dia , cada minuto , cada mera mudança de tempo .
 

Daniel Sena Pires - Helena (As minhas estações) (12/05/2010)

sexta-feira, 18 de março de 2011

Da história, dos brinquedos e do natural



Podei os galhos fracos, e a árvore fez-se maior
Tateei meu próprio refúgio, numa manobra arriscada e cruel
Era cedo, e pouco havia pra se ver
E foi buscando não cair, que não voei e fui mais longe

Ou quem sabe não comum, medi mal por não saber
Do alto de uma experiência errada, avariado e confuso
Jurei que eu era vão, um pouco torto, um pouco mudo
E o pior é que quase nunca gosto mais do que tenho, quanto gostaria se não tivesse ou não visse

Iniciou-se o luto, acabou o mundo
Que viagem foi essa que fiz da calma ao desespero?

Da cama ao precipício, acordando pra ouvir
Época essa em que gastei meu saber com imperfeição

Briguei com meu passado, brincando de não fui
Sobre a cama, aquela velha camada de gelo, tão espessa quanto queima
Num susto ontem, quase grito … calei, sem fôlego, e esperei uma hora melhor
Saltando os acertos, ainda me sobra o tempo quase todo

Niilismo breve sobre os homens e seus carros
Sobre a vida e seus brinquedos, sobre os postes e as estradas …
Que levam homens e seus brinquedos, por sobre vidas desmontadas
Por sobre carros … projetados porque a vida é sempre o melhor dos brinquedos

Em janeiro faz exatamente frio
Depois de um ano todo, um desgosto todo sem gosto …

E em um mês, no máximo dois …
Um suspiro, quase nervoso … meio alertando

Ah, o fato de fazer de todo pensar um penar de não ter
Rima com o intuito de não esperar
Casa com o rumo de nunca encontrar
Mas rebate a si mesmo, que tarde é a hora em que os homens felizes se felicitam e brindam

Pois não é tão doce escolher
Como se pensa ao se ver
Mas no final vale a pena

Mais do que não pedir
Abrir o corpo, sair …

E remar sempre, porque um dia as ondas haverão de baixar.

Daniel Sena Pires  -  Da história, dos brinquedos e do natural (18/03/2011)

terça-feira, 8 de março de 2011

A arte das rosas de papel


Bons tempos
Aprendendo a manusear meus sentimentos
Saudando os dias, com o velho sorriso cor de sempre
Tomando o céu pela manhã, tomando gosto por deserdar monções
As lições enaltecem o futuro, que, apesar disso, nunca é tão bom
Procurar fuga do vazio, e encontrar soluços …
Vindos de onde vem qualquer amor, qualquer raiva …
Qualquer querer, escolhas próprias do óbvio
Refletir sobre como, independente do minuto, não há como saber o que exatamente faz esse coração palpitar dificultoso
Quantas saudades …
Mas sempre há um bem-estar ao gerar voz ao que sinto
Seja sozinho, ou seja pro mundo
Seja verdade, ou seja só pra me sentir melhor
E mesmo não entregue ao que antes era certeza de “felicidade”
Posso seguir, que pena, humano, esperançoso... talvez eu 'cace' um tom melhor
E tão mais doce é futurar alguém feliz
Melhor do que me acabar de medo, e antecipar, impulsivo, falhas que possam me ocorrer
Fabricar o que é bom, não deveria ser tão difícil
Acontecer por si só, é um prazer arriscado.

A arte das rosas de papel

Que não chova e nem se chore demais sobre as que se tem .

Daniel Sena Pires – A arte das rosas de papel (08/03/2011)